05/11/2018

SEXUALIDADE INFANTIL

Eliani Gracez  

         As tendências reprimidas que se encontram no inconsciente, segundo Freud, “trata-se quase sempre de tendências sexuais”. Um pansexualismo que ainda perpassa a obra de Freud e seus discípulos. Não vamos confundir o “quase sempre” com “sempre”. Se no inconsciente encontram-se uma parte maior de tendências sexuais do que outras tendências, isso deve-se ao fato da existência de processos inconscientes expulsos da consciência pela repressão. Os elementos que não foram reprimidos permanecem na consciência.
         Desde longa data, a sociedade e tendências religiosas, condenam a livre expressão da sexualidade. Sendo canalizada esta expressão para o casamento legal, ou seja, um único parceiro de sexo oposto e para toda a vida. Questões sobre a sexualidade são estudadas por Freud desde a infância do analisando, e assim ele afirma tendências sexuais na criança. Ao afirmar a sexualidade infantil, foi possível também afirmar a repressão sexual na criança promovida pelos pais e pela sociedade. Repressão esta que foi feita a partir de um modelo de educação opressor que não prepara a criança para a sexualidade e sim reprime a pulsão sexual desde a mais tenra idade. E assim Freud conclui que se os elementos sexuais são reprimidos desde a infância é porque eles estão lá desde este estágio. Com esta visão, fruto de dedução dialética, Freud conquistou adversários e verdadeiros inimigos, chocou o senso comum bem como os meios científicos e pedagógicos de sua época. Ele demonstrara a partir de seus estudos sobre o inconsciente que o espírito crítico e o julgamento racional do homo sapiens constituem apenas uma parte do psiquismo humano. Ao lado deste psiquismo existe uma mentalidade pré-lógica, afetiva que emana do inconsciente. Este material, muito mais pressentido, influi no raciocínio lógico. Isso significa que os medos, a repressão, a moral e a forma como uma criança é educada tem uma grande influência na racionalidade. Filósofos e médicos, contemporâneos a Freud, ao invés de procederem como pessoas de ciência, comportaram-se como o “homem da rua”. Suas observações exprimiam o preconceito da cultura e do meio social. Existe na criança uma espécie de pré-sexualidade que não se queria ver, e a curiosidade sexual da criança era reprimida.
         Para o psicanalista Abrahão Brafman, o estilo de vida de alguns pais cria problemas nas crianças. A criança se constrói a partir dos exemplos dos pais e daqueles que convivem com ela. O desenvolvimento cognitiva, intelectual e emocional da criança, afeta a visão que a criança tem de si e do mundo. Com a visão da sexualidade na criança foi possível entender melhor o adulto, pois há na criança os traços do instinto sexual. Esse instinto, quando não trabalhado adequadamente na infância, pode dar origem a perversão sexual no adulto.
         O complexo de Édipo rendeu a Freud o título de imoral. Moralistas e preconceituosos tornavam a criança assexuada. A noção de que a criança se identifica com o sexo oposto, podendo desejar sua mãe e odiar o pai, feriu sentimentos na época de Freud. Quando Freud falava de sexual seus adversários compreendiam genital. Isso em Freud é um absurdo! O adulto sente o impulso sexual e toma consciência dele, do objetivo e do objeto, a criança sente o impulso sexual, mas não toma consciência dele.
         Quanto a extensão do termo sexualidade, que foi frequentemente criticado, um simples olhar para a teoria freudiana nos dá a percepção de que o termo abrange mais do que sexo genital. O amor maternal, a ternura, a fraternidade e amizade, derivam da sexualidade. Embora Freud não quisesse afirmar que a amizade, amor, ternura e fraternidade fossem em si elementos sexuais, mas sim que derivam do instinto sexual, da libido e que estavam deslocados ou transformados no psiquismo.
        Para conhecer um pouco mais sobre o complexo de Édipo é preciso remeter ao esquema conforme Freud o concebeu nos Três ensaios sobre a teoria da sexualidade, que tratam de forma clara sobre o pensamento freudiano.
             I - Apego da criança em relação a mãe ou parente de sexo oposto ao seu.
           II - Hostilidade e ciúme, em relação ao pai ou parente de mesmo sexo, decorrente do primeiro processo.
           III - Sentimento de admiração e de afeição em relação ao parente de mesmo sexo e que se superpõe aos sentimentos hostis e cria ambivalência.
          IV - Sentimento de culpa, geralmente inconsciente e que são o cerne da hostilidade experimentada.
         Assim o menino amará sua mãe e sentirá ciúmes do pai, considerado no inconsciente como seu rival. No entanto, ao mesmo tempo, ele admira a força do pai. O mesmo acontece com a menina que amará seu pai e verá a mãe com hostilidade.
        O complexo de Édipo existe em todas as crianças. Se elas conseguirem eliminá-lo, normalmente esse é o caso, terão chances de não terem dificuldades ou transtornos sexuais. Do contrário estará aberta a porta para as neuroses. É a partir do complexo de Édipo que a sexualidade no adulto começa a tomar forma. O primeiro amor da menina é pelo pai, e deste amor derivam os demais na faze adulta. Mas para isso é preciso vencer o complexo de Édipo e substituir a sexualidade infantil pela sexualidade adulta. O adulto sente o impulso sexual e toma consciência dele e de seus objetivos. A criança sente um impulso semelhante a do adulto mas não toma consciência dele. Quando um adulto sente um impulso sexual, múltiplas formas de representações, jogos sexuais e suas consequências tomam conta da consciência. Nada disso acontece com a criança.
      O preconceito de pessoas que não queriam ter seu inconsciente revelado e que sustentavam uma criança pura, angelical e assexuada levou a acusação de um Freud imoral. No entanto, o pensamento freudiano está embasado no amor maternal, na ternura filial e a amizade que derivam da sexualidade. As relações que unem a mãe e a criança, de certa forma e as relações sociais entre os indivíduos, são ligações amorosas.

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