Eliani
Gracez
Na
psicanálise a mentira é uma distorção do conteúdo psíquico a ser analisado. Contar
uma verdade requer coragem para o enfrentamento com a realidade da vida, coragem
essa que nem todos possuem, por isso, aparentemente, é mais fácil mentir. Nem
todos estão preparados para o enfrentamento nu e cru com a verdade. Nietzsche se
perguntava: quanta verdade sou capaz de suportar? A mentira pode se tornar patológica quando o
analisando tende a se expressar pela mentira compulsivamente. Essa compulsão
pode se manifestar em pequenas ou complexas inverdades. Muitas vezes, a pessoa
não tem o menor controle sobre a compulsão, mentindo até mesmo nas coisas mais
banais do dia a dia. Por trás dessa compulsão pode ser encontrada uma baixa
autoestima ou até mesmo uma onipotência narcísica. No narcisismo, mãe e bebê estão em uma situação psíquica onde
persiste um forte grau de fusão, uma não diferenciação um do outro por parte do
bebê. Quando o bebê sai da fase simbiótica, ele inicia a fase de separação e
diferenciação do eu com relação ao outro. Uma diferenciação entre o bebê e sua
mãe. Desta forma se dá o nascimento psicológico da criança. Na fase simbiótica
o bebê acredita que os atos de sua mãe é fruto do seu desejo. E assim se forma
no bebê a ilusão de que todos estão ali para ele e somente para ele. Uma ilusão
se forma onde o bebê é a majestade e os outros seus súditos. Essa onipotência,
em alguns casos, permanece
até a fase adulta, onde as pessoas que rodeiam a pessoa onipotente estão ali
para servi-la. O narcisista não lida bem com a frustração e se torna agressiva
quando confrontada. Outro tipo de mentiroso é aquele que mente para sustentar
um status que, por vezes, ele não possui. Mente para parecer ser aquilo que de
fato não é. O mentiroso também pode mentir pelo prazer de ver uma pessoa se dar
mal. Uma psicopatia onde pessoas assim não têm pudor algum. Tratando o outro
como objeto para impor sua vontade. O mentiroso, na maioria dos casos, trava
uma luta para manter sua autoestima e o medo de ser rejeitado. A necessidade de
autoafirmação, de ser aceito em um grupo social ou de ser popular entre colegas
de uma escola são motivos para uma pessoa insegura mentir. No setting analítico
(consultório) é preciso diferenciar o que é mentira, fantasia e delírio,
daquilo que de fato está acontecendo. A fantasia é um processo de imaginação de
como poderia ser a realidade. Uma pessoa pode imaginar que um fato aconteceu de
uma forma quando na realidade aconteceu de outra forma bem diferente. Já o
delírio é fruto de uma confusão mental, podendo ser acompanhado de alucinações
visuais. Nesse caso, a pessoa não está mentindo, ela apenas retrata visões
ilusórias existentes somente em seu psiquismo. Mas voltemos ao mentiroso. A
mentira pode ser uma resistência que a pessoa tem em aceita a realidade ou em
trabalhar o problema em si. Uma fuga do enfrentamento com a realidade. O
fenômeno da resistência tem sido observado desde os primórdios da psicanálise e
continua sendo considerado a pedra angular na prática analítica. Motivo pelo
qual, a resistência ainda continua sendo estudada em seus mais variados
prismas. O pensamento lógico e organizado pressupõe um ego forte e capaz de
tolerar tensões, mas nem todos possuem essa força. E sempre que a realidade impõe
eventos desagradáveis, aquele que não possui um ego forte, prefere a mentira ao
enfrentamento com sua realidade. Nesse caso, a mentira torna-se um mecanismo de
defesa onde a realidade é negada. E assim temos a mentira como um mecanismo de
defesa e de negação da realidade. Alguns mentem por compulsão, outros mentem
para tirar vantagens de uma situação. Na política é possível encontrar a
mentira como uma atuação profissional. Verdadeiros atores que fazem a mentira
ter o valor de uma verdade. A mentira usada politicamente pode ser fundamentada
em Platão e Maquiavel. Platão, no livro A república, dizia que o governante
poderia mentir para o bem coletivo. Em o príncipe, Maquiavel afirma que o
governante deve agir segundo a moral sempre que possível, mas deve infringi-la
quando for necessário para a manutenção do poder. Assim a mentira pode ter
várias causas: receio das consequências, insegurança, maldade, baixa da
autoestima, isenção de culpa, razões patológicas etc.
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