A moral constituída ao longo do tempo
interfere diretamente no principio de prazer, alterando o aparelho psíquico e reprimindo o prazer, com isso o indivíduo cai no desprazer, tornando-se uma
bomba prestes a explodir a qualquer momento. A noção de “Eu” em Freud pode ser
entendida a partir de sua teoria do funcionamento mental. Do ponto de vista da teoria freudiana, os processos mentais são
regulados pelo princípio de prazer. Esse princípio decide o propósito de vida. Freud comparou o funcionamento da mente humana
com uma ameba.
“Freud comparou o funcionamento da mente, o mais
complicado órgão, com o funcionamento do mais simples organismo, a ameba. A
vida é mantida através da admissão num organismo da matéria estranha, mas útil,
e da descarga da sua própria, mas perniciosa matéria. Admissão e descarga são
os mais fundamentais processos de qualquer organismo vivo. A mente, que também
faz parte de um organismo vivo, não constitui exceção a essa regra: realiza a
adaptação e o progresso mediante o emprego, ao longo de toda sua existência,
dos processos fundamentais de projeção e introjeção. As experiências de
introduzir alguma coisa no Eu e de expelir alguma coisa do Eu são eventos
psíquicos de primeira grandeza”. (HEIMANN, 1969, p. 143)
Freud entendeu que os processos mentais são regulados pelo princípio de
prazer. A mente, nesse caso, regula a quantidade de excitação nesse aparelho.
A isso Freud nomeou de pulsão. A pulsão,
na busca pela supressão, precisa de um objeto. E assim temos um limite entre o
psiquismo e o somático. O corpo como objeto das pulsões. Encontramos aqui o ponto onde tudo converge
para a repressão. O moralismo na forma com que a criança é criada, religião,
influências do lugar onde vivemos etc, tendem a negar as pulsões no corpo,
muitas vezes tratando como pecado, falha de caráter, desajuste social, uma descarga
pulsional. São exemplos de descargas pulsionais a sexualidade, a dança, o
cigarro entre outros.
O aparelho mental tem
importante papel na formação do Eu, ele distingue o mundo interior do mundo
exterior, ou seja, ele distingue a subjetividade da objetividade. No entanto o
Eu não é somente constituído pela subjetividade e nem tão somente pela
objetividade, existe mais do que isso no aparelho psíquico.
Segundo Freud, o ser
humano possui um inconsciente onde estão contidas nossas frustrações, medos,
angústias, emoções aprisionadas que ainda não foram trazidas a luz da
consciência. Para Freud o inconsciente governa nossa respiração, digestão e
batidas do coração. Segundo Freud não somos senhores de nós mesmos, não nos
autoafirmamos na consciência, mas sim naquilo que é inconsciente. Sem falar,
que a civilização exige sacrifícios. A civilização é o que diferencia o homem
dos animais. Ele afirma que o homem valoriza mais o que o outro tem e menos o
que realmente é importante em sua vida, e assim vive o homem em busca de
riqueza, poder e sucesso. Já a cultura causa um mal estar nos homens, e este
paga o preço da renúncia da satisfação pulsional. Freud também afirma que a
religião é uma busca por amparo.
Olhando uma cena comum
em um parque, é possível ver crianças que se lançam do alto de brinquedos nos
braços de seus pais. A certeza do amparo e da mão firme e da confiança em seu
pai dá a segurança para a criança. E assim ela se lança confiante, e o braço
forte do pai a ampara. No entanto, nem todos receberam o amparo necessário na
infância para se tornarem adultos seguros de suas decisões. O desamparo pode
gerar insegurança pela vida a fora. Não foram todos que tiveram o braço firme e
o olhar amoroso que dá a segurança de sermos amados, ou uma estrutura familiar
e os cuidados da mãe. Quantos não tiveram isso?! Pelo contrário, tiveram o
olhar de quem sabia que a punição viria. Quantos cresceram sem amparo. E a
insegurança hoje toma conta de pessoas que nem se deram de conta do seu desamparo.
A fragilidade humana começa quando nascemos, pois o nenê necessita ser amparado
e ser cuidado. E com isso começa a dependência na formação de cada pessoa.
Portanto, a posição natural do ser humano é de desamparo, e precisa do amparo
para sobreviver. Precisa do cuidado do outro. Para Nietzsche (1844-1900), o
homem é uma corda estendida entre o animal e o super-homem, uma corda sobre o
abismo. O caminho do homem passa pelo abismo! Isso nos diz que o caminho é
inseguro e perigoso. Nietzsche anuncia a morte de Deus, e assim o homem fica
desamparado até mesmo daquilo que lhe é sagrado, Deus. Para Freud, é no
desamparo que as religiões encontram seu lugar. Um porto seguro, uma mão
invisível, uma moral que garanta estar fazendo a coisa certa, uma fé, uma crença
em algo, uma certeza mesmo que ilusória, um pai protetor.
A vida psíquica é
constituída pelo id, super ego e ego. O id é o que está no insciente de uma
pessoa. São os instintos, desejos, impulsos e libido. O id é a estrutura de
pensamento original e básica. As leis da lógica não se aplicam ao id, por isso
estão contidos nele os impulsos irracionais que não estão a luz da consciência.
Se o id é aquilo que está no inconsciente, o ego é o que está em contato com a
realidade externa, é uma parte do id que se desenvolveu ao entrar em contado
com a realidade e por isso se tornou aparente. Uma das funções do ego é
estabelecer uma conexão entre a percepção sensorial e a ação muscular. Os
acontecimentos internos pertencem ao id, mas cabe ao ego satisfazer os
instintos ou suprimi-los. O ego é a parte executiva da consciência. O ego é
quem dá vazão aos impulsos oriundos do id, e assim o ego se origina do id e o
superego se origina do ego. É o superego quem a partir da moral, tradição,
costumes, religião etc., emite um julgamento, ideais e metas. O superego é que
decide o que está certo ou errado. A infância e o conceito de infantil, sempre
estiveram presentes na obra de Freud. A infância é um período de tempo na vida
de uma pessoa, já o infantil é atemporal. A psicanálise valoriza não somente as
recordações da infância, mas também a infância esquecida. O infantil remete ao
conceito de recalque, pulsão e inconsciente. Em linhas gerais, a meta
fundamental da psique é maximizar o prazer e minimizar o desprazer, retendo ou
trazendo a consciência dados do inconsciente. Freud, desde o início de sua
carreira, desenvolveu um determinismo que o levou a encontrar a causa das
neuroses. Para tanto, passou toda sua vida debruçada sobre a alma dos
neuróticos. A psicanálise, tem sido, desde então, uma busca pelas causas
ulteriores para o comportamento e angústia do ser humano, uma busca por
compreender a si mesmo e o outro, e com isso adquirir um equilíbrio psíquico. O adoecer e a
reorganização da psique tornaram-se uma possibilidade terapêutica que encoraja
o neurótico a superar seus conflitos, entre a pulsão e a saúde psíquica, ao
trazer a luz os impulsos inconscientes reprimidos ou recalcados. O adoecer do neurótico está vinculado
a uma situação patológica de frustração das pulsões e repressão da libido,
sendo assim, o adoecer é consequência e não a causa de um transtorno
patológico. Causas prováveis de neurose são, em geral, rigidez moral que causam
recalque na infância, frustrações, falta de amor, desestrutura familiar, rigidez
ética imposta pela sociedade. A repressão e mecanismos
coercitivos da sociedade são fomentadores de conflitos, por exemplo, a libido
versus ideal acético. E assim se instala uma luta entre dois impulsos gerando a
doença ou neurose. Não vamos aqui confundir a luta entre duas polaridades que
acontece na hora em que o indivíduo tem que fazer uma escolha, mas sim entre o
ego e aquilo que muitas vezes ficou recalcado no inconsciente, uma verdadeira
luta entre a doença e sua causa. A luta só pode ser vencida quando os dois
oponentes se encontram em campo de batalha, onde um pode ver o outro, a luta
acontece no consciente. E assim a neurose e sua causa se encontram para a
solução do conflito instalado. Desse confronto surge, de alguma forma, uma
solução para o neurótico. Uma luta consciente da causa e seu subsequente
efeito. A psicanálise se esforça em
compreender o Eu na sua luta pelo desenvolvimento. O recém nascido não se
diferencia da mãe, não separa seu eu com o mundo exterior. Quando pela primeira
vez ele percebe o mundo exterior é pelo desprazer quando é retirado o seio da
mãe. O seio é o primeiro objeto que separa o recém nascido do mundo exterior.
Uma luta constante do Eu com o desprazer leva o Eu ao isolamento de tudo o pode
levar ao desprazer. Surgindo assim um Eu que busca o prazer e foge do
desprazer. E assim chegamos aos dois princípios que regem o funcionamento
mental: o princípio de prazer responsável pelos processos inconscientes, e o
princípio de realidade responsável pelos processos conscientes. O principio de prazer
é um direcionamento de energia ou de descarga punsional que tem por objetivo a satisfação
ou o prazer. Tendo em vista o principio de realidade, nem sempre o principio de
prazer atinge a satisfação desejada, seja por conta de uma realidade de castração
na infância, de uma realidade sociocultural ou moralismo. O principio de realidade
se manifesta na censura interna que impede o sujeito a desobedecer a questões éticas
e morais para atingir a satisfação e desejos internos. O princípio de prazer descrito
por Freud direciona a ação psíquica e orgânica para atingir um prazer idealizado.
Enquanto isso o princípio de realidade se manifesta na relação sociocultural e na
formação de conceitos morais e éticos, onde o indivíduo passa a respeitar os limites
impostos pela moralidade. No princípio de realidade a moral controla o princípio
de prazer.
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