17/07/2017

Duas Massas Artificiais: A Igreja e o Exército

Eliani Gracez Nedel
        
          Podemos distinguir tipos de massas (psicologia social ou de grupo) diferentes em sua formação e orientação. Massas duradoras e massas fugazes, massas constituídas por indivíduos semelhantes e massas constituídas por indivíduos não semelhantes, massas naturais e massas artificiais, massas primitivas, massas altamente organizadas. Nossa investigação volta seu olhar para as massas artificiais: igreja e exército. A igreja e o exército são massas artificiais porque empregam certa ação coercitiva externa para não se diluir e nem modificar sua estrutura. Normalmente as pessoas não são consultadas se desejam entrar em uma massa dessas, não existe livre arbítrio. Essas massas através de ações coercitivas estão protegidas pela desagregação. Tanto na igreja quanto no Exército encontra-se a ilusão de que existe um chefe que ama a todos. Na igreja católica há o Cristo, no Exército, o general, que ama a todos na massa com igualdade. Sem esse princípio coercitivo tanto a igreja quanto o Exército se desintegrariam. Na igreja o amor a Cristo, no Exército o amor a pátria. A relação dessas duas massas com o indivíduo crente se dá de forma paternal. Na igreja existe uma linha democrática porque todos são iguais diante do Cristo. Com razão a igreja se assemelha a uma família unida como irmãos em Cristo. Algo semelhante acontece com o Exército onde um general ama a todos os seus soldados do mesmo modo. Uma hierarquia muito semelhante formou-se tanto na igreja quanto no Exército. Toda religião é uma religião de amor para aqueles que a seguem, mas tende a intolerância para aqueles que não pertencem a essa massa moralmente organizada.
           As neuroses de guerra, reconhecido como protestos do indivíduo contra o papel que lhe era atribuído no Exército e contra a desumana situação da guerra estão entre os motivos do adoecer. Nessas duas massas artificiais o indivíduo encontra-se ligado libidinosamente ao líder e aos demais indivíduos da massa. Existe uma ligação libidinosa no Exército com relação ao pânico que surge quando a massa se desagrega. O exército que sucumbe ao pânico pode ter suportado perigos incalculáveis. O indivíduo que tomado pelo medo cuidar de si mesmo  denota ter cessado as ligações afetivas. Agora enfrenta o perigo sozinho, e com isso existe um afrouxamento nas estruturas libidinosas da massa. Essas observações são para o caso de grande perigo e real. A desagregação de uma massa religiosa não é comum de acontecer.

 A identificação

          A identificação é conhecida como a manifestação mais precoce entre as ligações emocionais. Ela está na pré-história do complexo de Édipo. O menininho se identifica com o pai, quer se tornar como o pai, ele gostaria de tomar o lugar do pai em todos os aspectos. E assim o complexo de Édipo ajuda a preparar a criança. Simultaneamente, esse menininho começou a fazer um investimento objetal da mãe. Ele mostra duas ligações: um investimento sexual de objeto com a mãe, e com relação ao pai uma identificação de modelo a ser seguido. A identificação é ambivalente desde o início, o menininho percebe que seu pai bloqueia o acesso junto a mãe, a identificação assume uma posição hostil e se torna idêntica ao desejo de substituir o pai junto a mãe. Nessa ambivalência a criança pode voltar sua identificação para a ternura como para um processo de eliminação. Nesse sentido, a identificação é a forma de ligação com o emocional mais antiga que existe, mesmo que seja para o recalcamento de mecanismos inconscientes. Muitas vezes o eu toma para si as qualidades do objeto, em muitos casos o eu toma as qualidades da pessoa não amada, podendo também tomar para si as qualidades da pessoa amada que se transforma em objeto. Nesse sentido, a identificação é a forma mais antiga de ligação entre o objeto e as emoções. Pela identificação acontece a introjeção do objeto no eu que forma uma emoção objetal libidinosa. Também acontece a identificação não objetal, esse tipo de identificação forma-se quando pessoas possuem características em comum.
          Outro exemplo de introjeção do objeto se dá na perda do objeto amado, causando autodepreciação do eu e melancolia. Na introjeção dá-se a consciência moral do eu ou autocrítica. Pouco a pouco a criança vai introjetando regras de comportamento moral que ela retira do meio ambiente em que vive, sobretudo na autoridade dos pais. A diferença entre identificação do eu com o objeto e idealização do eu para com o objeto encontram-se no estudo de duas massas: a Igreja cristã e o Exército. No Exército o soldado toma o seu comandante como ideal enquanto se identifica com aqueles que são iguais a si, dessa comunhão de eus derivam as obrigações da camaradagem e divisão de bens. Na igreja Católica as coisas são diferentes, a igreja exige que cada cristão se identifique com Cristo e ame os outros cristãos como cristo amou, o objeto nesse caso é o amor. A igreja exige um amor objetal e ideal. Com isso ela une o objeto ao seu ideal através da identificação com o Cristo. Esse avanço libidinal da Igreja Católica baseia sua pretensão em ter uma moral mais elevada.


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