A raça humana
passa 1/3 de sua existência dormindo, e ao dormir, sobrevêm os sonhos. Algumas
pessoas sonham eventualmente, outras sonham com mais frequência, outros ainda
pensam não sonhar. O fato é que o interesse pelo sonho vem de longa data. Há
mais ou menos 4 mil anos os egípcios acreditavam que os sonhos fossem mensagens
divinas. Daquela época até os dias de hoje, muitas teorias e pesquisas sugiram.
Cientista, filósofos e psicanalistas destinaram um tempo de suas pesquisas aos
sonhos. Neste artigo, vamos estudar algumas dessas pesquisas, inclusive aquelas
teorias que afirmam a essência divina dos sonhos.
Dormir não é
somente um privilégio humano, os animais também precisam dormir. Se o sono não
fosse algo importante ele já teria sido eliminado, pois durante o sono os
animais ficam mais vulneráveis a ataques de predadores. Entre os humanos, a
quantidade de sono varia de pessoa para pessoa, uns acordam revigorados com
cinco ou seis horas de sono, outros precisam dormir por mais tempo. Enquanto
dormimos os processos metabólicos continuam, dormir não é uma parada do coração
e nem do cérebro, muito menos uma parada respiratória. No processo do sono
músculos se movem de vinte a quarenta vezes, pois a pessoa se movimenta
enquanto dorme.
A glândula
pineal, que o filósofo francês René Descartes (1596-1650) considerava a morada
da alma, e os hindus, a sede de um dos chacras mais importantes do corpo, também
é ela que produz o hormônio do sono chamado de Melatonina. Com o fim do dia e a
redução da luz a melatonina passa a ser liberada, trazendo o sono. Um dos
motivos da falta de sono é a baixa produção de melatonina.
Durante o sono
o cérebro continua ativo. Nas últimas décadas exames foram realizados com
aparelhos de eletroencefalograma que registram ondas cerebrais durante as horas
de sono e de vigília, mas uma das grandes descobertas foi em 1951, pelo pós-graduado
em psicologia Eugene Aserinsky, o chamado sonho REM (Rapid Eye
Moviment/Movimento rápido dos olhos). A fase REM do sono é aquela onde se
observam movimentos nos olhos. Nesta fase, os sonhos são mais vívidos. A fase
REM do sono tem atividade cerebral similar à fase em que se está acordado.
Em 1959,
William Dement fez um experimento de privação de sono com o locutor de rádio
Peter Tripp. O locutor ficaria acordado por 200 horas. Nos primeiros dias o
locutor manteve sua lucidez, mas logo vieram alucinações, e cinco dias depois
ficou seriamente perturbado, chegando a ver o terno de alguém de sua equipe
cheio de vermes, acusando outra pessoa de ser o coveiro que viera medi-lo para
fazer seu caixão. Com o fim da experiência, o locutor dormiu e recuperou a
sanidade, permanecendo por semanas com a sensação de depressão.
Existe uma
nítida ligação entre o sono e a depressão. Dormir bem ajuda pessoas com depressão
a ter uma melhor qualidade de vida, e a falta do sono a ter uma recaída na
depressão. Pacientes com depressão, em sua maioria, relatam algum distúrbio do
sono. O sono é importante para a saúde física e mental. Estabelecer bons hábitos
de sono é fundamental, sobretudo, para quem sofre de depressão ou bipolaridade.
No entanto, normalmente, o sono é a primeira coisa que sacrificamos quando
estamos estressados ou sobrecarregados de serviço. Durante o sono existem
várias fases distintas, incluindo alterações nos batimentos cardíacos,
movimentos musculares e muito mais. Um processo inconsciente que dura a noite
toda. Dormir mal ou ter poucas horas de sono, como também dormir
excessivamente, pode afetar a saúde física e mental, por isso autorize-se a
dormir adequadamente.
Segundo Eddie
Van Feu, sonhar pode ser o produto mental do mesmo tipo de processo psicológico
que se percebe nas enfermidades mentais. A diferença é que o sonho se dá quando
dormimos. De alguma forma, enquanto dormimos, somos delirantes e dementes.
O sonho é mais
importante para a psicanálise do que o sono em si. Ao dormir, vem o sono leve e
os pensamentos podem ficar descoordenados. Sobrevém o sono intermediário onde
pode haver experiências sensoriais irreais e pequenos tremores repentinos no
corpo. Então vem o momento do sono mais profundo ainda, onde a pessoa fica
aleia aos movimentos ao seu redor. E por fim, no último estágio vem o sono mais
profundo onde pode haver o sonambulismo, algumas pessoas nesse estágio falam
enquanto dormem. No sono REM, onde ocorre ativação do sistema límbico do
cérebro, movimentos primitivos acontecem, é onde, segundo Freud, ocorre a
regressão que leva aos estados primitivos da infância. O sonho parece estar
além da linguagem conhecida por nós, isso porque desconhecemos muitos dos
simbolismos que se apresentam em sonhos. No entanto, em uma avaliação mais
detalhada, é possível perceber que o significado está no cotidiano ou na vida
pregressa do sonhador. Uma paciente certa vez teve o seguinte sonho: sonhou que
uma pessoa que ela gostava estava sendo ameaçada por um bandido. Ela não
compreendeu o sonho e nem sabia quem eram aquelas pessoas que apareciam no
sonho, mas estava preocupada com as ameaças feitas. Quando perguntei à ela quem
era a pessoa que ela gostava na vira real, após um breve silêncio ela resposta
que era o namorado. Quando perguntei
quem era a pessoa que ameaçava o namorado ou o namoro, ela respondeu que era um
ex namorado que insistia em voltar a namorá-la. Aquilo que a princípio carecia
de entendimento, tornou-se claro em uma análise da vida cotidiana da analisanda
e da pergunta certa, ou, assertiva. O sonho precisa ser interpretado a luz do
conteúdo interno de cada sonhador. Somente o sonhador pode dar significado ao
seu próprio sonho ao trazer o sonho para sua própria linguagem, símbolos e
signos. Em muitos casos é o sentido daquilo que sonhamos que deve ser
analisado. No sonho citado anteriormente, o sentido está no medo das ameaças. A
analisanda se sentia ameaçada pelo ex namorado que desejava reatar o namoro. Para
Freud, o sonho é a estrada real que conduz ao inconsciente. A interpretação de
símbolos, a partir do conteúdo do sonhador, é fundamental para compreender a
natureza humana. Em um sonho é possível saber como o sonhador lida com as
forças malignas ou sombrias, para então entender como a pessoa desperta lida
com a adversidade, oposição de ideias etc. Carl Yung, discípulo de Freud,
acrescenta algo importante aos sonhos que ele chamou de eventos psíquicos. Um
exemplo desse tipo de sonho é uma criança que sonhou que anjos estavam levando
seu irmão, quando acordou o irmão havia falecido.
Com o fenômeno
dos sonhos surgiu no passado da humanidade o conceito de alma humana que agia
no mundo dos sonhos. Na antiguidade, alguns povos pensavam que os sonhos
possuíam um significado. Pessoas como os profetas e sacerdotes traduziam as
mensagens contidas nos sonhos. Hipócrates, médico grego (460-377 a.C.), escreveu
no Tratado sobre os sonhos: “Alguns sonhos são de inspiração divina, outros são
frutos do corpo físico”. Hipócrates acreditava que nos sonhos era possível
prever doenças. Segundo ele, se em um sonho os astros são vistos fracamente, ou
brilham fracamente e parecem ter parado de girar, isso é sinal de doença.
Hipócrates vai mais adiante, a cor preta em sonho é sinal de doença física,
sonhos de voo indicam perturbação mental. No Egito antigo, temos a famosa
interpretação dos sonhos de José (Gênesis, antigo testamento). São vários
sonhos interpretados por José, e outros sonhos que o próprio José sonhou e que
se tornaram realidade. Um dos sonhos interpretados por José foi o sonho em que
o faraó viu sete espigas de milho subindo de uma mesma haste granada e bela, mas
eis que sete outras espigas de milho pequenas e queimadas nasciam atrás delas,
e as sete espigas pequenas e queimadas devoravam as sete espigas granadas e
belas. José disse ao faraó ser um aviso que a região teria sete anos de fartura
, e depois viriam sete anos de miséria. Acreditando na interpretação de José, o
faraó deu a José a tarefa de armazenar um quinto de todo o grão que fosse
colhido no período de fartura. Passados sete anos de fartura sobrevieram os sete
anos de escassez, como José havia interpretado. Conta na Ilíada de Homero que enquanto Aquiles
dormia o fantasma de seu amigo Pátroclo apareceu para ele dando instruções
sobre seu funeral. A Bíblia conta que em
sonho José recebeu orientação sobre a gravidez de Maria: “José, não temas
receber Maria como tua esposa, porque o que nela está gerado vem do Espírito
Santo” (Mat 1:20). Também a gravidez do
Buda Siddhartha Gautama, foi revelada à sua mãe em sonho, e Maomé recebeu de
Alá a primeira parte do Corão em sonho. Pela manhã Maomé interpretava seus
sonhos e o sonho dos seus discípulos.
O filósofo francês René Descartes (1596-1650)
era um exímio sonhador, em 10 de novembro de 1619, Descartes teve três sonhos. Os
dois primeiros cheios de aparições, vendaval e trovões que ele interpretou como
sendo representações das consequências de seus pecados. No terceiro sonho ele
recebia um dicionário e um livro de poesia. Descartes interpretou o dicionário
como sendo a ciência, e o livro de poesia como sendo a filosofia. O filósofo
Frances acreditava que ele tinha sido visitado pelo espírito da verdade. A
romancista inglesa Charlotte Brontë (1816-1855) dizia que quando tinha
dificuldades com seu texto ela se concentrava nele antes de dormir e acordava
com o problema resolvido. Napoleão Bonaparte (1769-1821) não desprezava as
ideias que vinham em sonho, ao acordar ele experimentava as táticas oníricas
com miniaturas em uma caixa de areia.
Encontramos
nos sonhos uma forma pela qual o inconsciente se expressa, um acesso ao mundo
da realidade de nossa não consciência, ou, inconsciência, ou, não sabedoria.
Com + ciência = consciência, mas, onde está aquilo que ainda não sabemos e que
de um momento para o outro passamos a
ter ciência? Se passamos a ter ciência é porque já estava pronto para ser
acessado em algum lugar no nosso mundo interior, esperando ser trazido a
consciência para ser estudado e analisado. Reza a lenda que do caos surge a ordem. A
própria bíblia diz que no principio só existiam as trevas. Seriam essas “trevas”
o nosso inconsciente caótico onde contem aquilo que será trazido a ordem e que
ainda não sabemos. Um filósofo antigo dizia que nós não sabemos nem mesmo o
quanto não sabemos. Bons sonhos!
2 comentários:
Parabéns Eliani. Muito interessante o assunto Sonhos.
Parabéns. Gostei muito do artigo. Adorei as citações e exemplos históricos. Lauria Bestriz Rodolf
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