Pois
é, nem Freud explica. Será que algum dia os homens tiveram realmente interesse
em conhecer a natureza feminina? Ou será que simplesmente criaram uma mulher
ideal em seu imaginário, e depois decidiram que a mulher real deveria ser igual
ao protótipo imaginado. O problema é o imaginário masculino, ele é imperfeito,
nós não. Saímos melhor do que a encomenda, é claro. Deus fez o homem, quando
aperfeiçoou fez a mulher. Não erramos, quando muito nos enganamos, por isso, de
vez em quando, fazemos a fila andar. Enganos acontecem. Mas, afinal, o que
querem as mulheres, perguntou Freud. Seria esta pergunta um enigma ou um
paradoxo. Acho que estamos mais para decifra-me ou eu te devorarei. Tem quem afirme
que a natureza da mulher é dual. Nesse caso, cada mulher teria uma outra mulher
dentro de si. Duas naturezas, “uma que diz mata, e uma outra, mais calma e
tranquila, que diz esgoela”. Se vocês estavam pensando que as duas naturezas
fossem o anjo bom e o anjo mau, aqueles que ficam um em cada ombro, erraram. A
mulher só tem um anjo. O bom da história é que ele dá conta de tudo sozinho. Já
o homem precisa de dois anjos. Lentamente, primeiro, o homem se aconselha com
um anjo, depois, se aconselha com o outro anjo, e, ainda assim, corre o risco
de errar. É que o homem nasceu primeiro. Mas nós mulheres compreendemos a
situação. Que ninguém diga que não somos compreensivas. Qualquer homem que
queira conviver com uma mulher, tem que compreender suas duas naturezas. Uma
visível e outra invisível. A natureza visível vive a luz do dia e pode ser
facilmente observada. Já a natureza invisível vem das entranhas de seu útero.
Só a mulher possui esta natureza, isso porque o homem não possui útero. Temos dentro de nós um
laboratório capaz de reunir, transformar, gestar, criar e trazer a luz algo
novo. Seja uma nova criança, uma nova vida, um novo modelo de comportamento
social, uma nova ideia etc. Alquimistas que somos e donas de um self lindamente
selvagem, fazem da mulher algo de semelhante a verdade. A verdade é relativa a
cada pessoa. O que é verdade para um pode não ser verdade para outro. Como
somos benevolentes, perdoamos o erro de Freud. Dois anjos, um em cada ombro, e
Freud fez a pergunta errada. A pergunta certa teria sido – Afinal, quem são as
mulheres. A pergunta certa é meio caminho andado para a resposta certa. Mas
como Freud errou a pergunta...
18/03/2012
16/03/2012
OS SAPATINHOS VERMELHOS
Em Os sapatinhos vermelhos, Hans Christian Andersen nos fala sobre
o que acontece quando a vida criativa é sufocada por uma moral inautêntica. Era
uma vez uma pobre órfã que não possuía sapatos. Com restos de trapos a menina
conseguiu costurar um par de sapatos vermelhos. Eles eram simples, mas ela
adorava o fato de os sapatinhos vermelhos terem sido feitos com suas próprias
mãos. Sentia orgulho disso. Um dia, porém, quando estava andando maltrapilha
pela estrada com seus sapatinhos vermelhos, uma carruagem dourada parou ao seu
lado. De dentro da carruagem, uma rica senhora de idade avançada disse a pobre
órfã que a levaria para sua casa e a trataria como se trata a uma filha. Seus
sapatos feitos a mão, orgulho da menina, foram trocados por reluzentes sapatos
feitos por um sapateiro. Ganhou roupas de lã e meias para aquecer seus pés no
inverno. Quando a menina perguntou pelos sapatinhos vermelhos, a velha senhora
respondeu que eles eram tão feios que ela os colocara no lixo. Triste, por
perder seus sapatinhos feitos à mão por ela mesma, ganhava tudo pronto. A
menina era obrigada a ficar sentada e quieta sem pular, e só podia falar quando
lhe era solicitado. Conforme manda os bons modos. No dia de sua crisma, o
sapateiro fez sapatos novos. Como a velha senhora era quase cega, semelhante a
alguns responsáveis por crianças, não percebeu que a menina escolhera sapatos
vermelhos. E assim, os sapatinhos vermelhos feitos a mão e com a criatividade
da menina, foram substituídos por sapatos vermelhos comprados prontos. Informada,
a velha senhora, sobre a cor dos sapatos de sua filha, fez o que muitos fazem,
proibiu a menina de usar sapatos daquela cor. Como se proibir fosse o
suficiente. A menina se apegou tanto aqueles novos sapatos, que usava ele
escondida da velha senhora. Ao colocá-los a menina tinha o impulso de dançar
livremente. Dançava, dançava e dançava, até não poder mais. Dançava tanto que
todos tentaram segura-la, mas foi inútil, ela não conseguia mais parar de
dançar. Saiu dançando porta a fora sem percebeu que ela perdera o controle
sobre os sapatos. Ela queria andar para a esquerda, mas os sapatos andavam para
a direita. A menina tentou se livrar dos sapatos. Mas ela dançava tanto que não
conseguiu. Os sapatos a conduziram para a floresta sombria, onde poucos
sobrevivem por lá. A menina lamentou-se por se deixar levar pelo fascínio
daqueles novos sapatos, tudo o que ela queria era sentir-se tão bem como se
sentira com os sapatinhos vermelhos feitos a mão por ela mesma. Não conseguindo
retirar os sapatos da menina, o único jeito foi amputar os dois pés. Com
sequelas para o resto da vida, a menina teve que sobreviver trabalhando como
criada em uma casa de família. Segundo Clarissa Pinkola Estés, esta história
nos fala da desvalorização da vida natural e dos danos aos instintos básicos de
sobrevivência em uma educação que desvaloriza a criatividade natural. Onde a
moral coletiva sufoca a vontade individual. Sufocado, o indivíduo sai em busca
de algo que lhe dê algum prazer, alguma alegria. A falta de alegria natural
levou a menina dos sapatos vermelhos ao vício. Quantas pessoas que perderam a
alegria de viver estão nesse momento nas esquinas comprando qualquer coisa para se entorpecer e dançar.
Eliani Gracez Nedel
Eliani Gracez Nedel
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